Um espaço de aprendizagem

Questionando

Retângulo composto por cinco faixas horizontais de mesmo tamanho, nas cores preta, magenta, branca, turquesa e preta.

Bandeira questionando, por Protego-Et-Servio. Fonte.

Questionando, em contextos LGBTQIAPN+, é um termo utilizado para descrever pessoas que não têm certeza de algum aspecto de suas orientações, identidades de gênero, corporalidades intersexo e/ou de outras identidades comumente ligadas a estas (como expressão de gênero).

Pessoas que estão questionando podem usar este termo no lugar de responderem sobre quais são suas modalidades de gênero/orientações/etc., ou podem usar questionando junto a termos específicos que acham que as definem sem haver certeza em relação a isso. Então, por exemplo, uma pessoa pode descrever sua orientação como questionando, outra como questionando entre lésbica e trixen, e outra como questionando ser trixen.

Aqui estão algumas observações para pessoas que estão questionando suas identidades, especialmente para as que têm o objetivo de especificá-las no futuro:

 

O processo de questionamento da própria identidade não é o mesmo para todes.

Algumas pessoas conseguem se encaixar em uma certa identidade desde a puberdade, ou desde que a pessoa conseguiu informação sobre tal termo, e utilizam aquele rótulo pela vida toda.

Algumas pessoas passam por várias identidades, até se fixarem em alguma ou algumas. Ou, podem até não se fixar em nenhuma.

Algumas pessoas passam anos se identificando com uma identidade, mas depois passam a se identificar com outra.

Algumas pessoas preferem utilizar termos abrangentes, não conseguindo ou querendo ter termos definidos para suas identidades.

Algumas pessoas nunca se definem com nenhum termo.

Algumas pessoas sentem que o questionamento é um processo contínuo, e outras sentem que é algo com início, meio, e fim.

Algumas pessoas nunca dizem que estão questionando suas identidades, mesmo mudando os termos que usam quando percebem que se encaixam melhor em outros.

Algumas pessoas só consideram que estão questionando suas identidades em um ou alguns pontos de suas vidas.

Algumas pessoas consideram que estão sempre questionando suas identidades.

Não se deve julgar o quanto alguém está certe sobre a própria identidade. Uma pessoa que escolhe um certo termo cedo na vida pode estar certa sobre ele, e uma pessoa que está constantemente se questionando pode simplesmente ter uma identidade difícil de descrever, ou bastante fluida.

A opressão causada pelo di/cis/heterossexismo vai afetar qualquer pessoa que não é nem perissexo, nem cis e nem hétero, independentemente do rótulo que alguém aplica a si mesme, mesmo que existam diferenças entre as experiências de certos grupos. Não há vantagens sociais em se identificar como alguém fora da norma, caso a pessoa não esteja fora da norma. Ou seja, as chances de alguém estar errade sobre fazer parte da comunidade LGBTQIAPN+ por um longo tempo são mínimas.

 

Como questionar a identidade de gênero?

É possível começar por reflexões sobre o próprio gênero, sobre se há algum ou sobre quais são os instintos e sentimentos em relação ao conceito. É importante não ver o gênero que foi imposto ao nascimento como uma obrigatoriedade, mas também não ver sua rejeição como a conclusão lógica de qualquer desvio da norma.

Algumas coisas que podem ser sinais de alguém ser trans, ulter e/ou não-binárie são:

  • Sentir-se mal sobre o tom de voz, os genitais, a altura, o formato do corpo, o formato do cabelo, roupas, etc., não em questão de se achar feie, mas sim em questão de preferir mudar estas coisas para as associadas a um gênero diferente, ou para características consideradas ambíguas ou sem gênero;
  • Não gostar de ser referide pelo gênero designado (“guri”, “moça”, “cara”, “mulher”, “homem”) ou pela linguagem designada (a/ela/a no caso de pessoas designadas mulheres ou o/ele/o no caso de pessoas designadas homens), não gostar do próprio nome por ser associado ao gênero designado, não gostar de revelar o próprio gênero quando isso não é necessário;
  • Questionar o próprio gênero com frequência, especialmente depois de descobrir que existem pessoas trans e/ou identidades não-binárias;
  • Não se sentir completamente incluíde em grupos destinados a apenas pessoas do seu gênero designado;
  • Sentir ódio por divisões sociais entre homens e mulheres (além das questões feministas, ou de apoio a questões de ativismo trans, não-binário e/ou inconformista de gênero);
  • Ter curiosidade de experimentar com expressões e identidades de gênero, para si e não para enganar/tirar sarro de outras pessoas. Também vale para experimentar conjuntos de linguagem que não são associados ao gênero designado ao nascer.

Mesmo assim, a experiência de cada pessoa é diferente. Por exemplo, uma pessoa agênero pode simplesmente não ter disforia e nunca ter questionado seu gênero, achando que todes se sentiam assim e que a divisão de gênero era só por causa de genitais; e então saber instantaneamente que era agênero quando viu pela primeira vez tal definição.

Algumas pessoas falam que se alguém fica pensando sobre ser trans ou não, há 99,9999% de chance da pessoa ser trans.

Vale lembrar que esta lista dá exemplos de sinais a procurar. Não significa que pessoas cisgênero não possam preencher absolutamente nada desta lista, ou que qualquer pessoa que não obedece os estereótipos de seu gênero designado é cisdissidente. Isso só pode depender do que cada pessoa se sente confortável em se identificar.

Mais recursos sobre questionamento de modalidade e identidade de gênero:

 

Como questionar orientação?

É possível começar refletindo sobre atração ou sobre a ausência dela. Você já se apaixonou? Tal pessoa se identificava com qual gênero quando isso aconteceu? Você acha pessoas de quais gêneros sexualmente atraentes?

Você já tentou se encaixar em um relacionamento considerado duárico (entre mulher e homem) e se sentiu mal com isso? E em um relacionamento que não seria considerado duárico? Se o relacionamento fosse com uma pessoa de outro gênero, você acha que daria certo?

Algumas dicas sobre definir atração:

  • Gostar de pornografia ou ter quedas por personagens fictícies não significa muito. Enquanto estas podem ser maneiras de entender sua atração, também podem ser maneiras de atrapalhar a percepção de sua orientação. Há diversas histórias de lésbiques tendo quedas por personagens homens mas nunca por alguém que é homem na vida real, ou de pessoas assexuais que conseguem se imaginar tendo sexo olhando pornografia mas que não conseguem sentir atração ou vontade na vida real.
  • Existem atrações além de sexual e romântica, como estética, platônica e sensual/sensorial. Muitas pessoas não usam termos para definir orientações dependentes de tais atrações, mas é importante ressaltar que achar uma pessoa bonita ou gostar de trocar carícias não significa necessariamente que há atração sexual e/ou romântica envolvida.
  • Não há problema em mudar o rótulo de sua orientação baseando-se em novas descobertas. E também é possível abrir exceções sem abrir mão de seu rótulo. Rótulos de orientações são guias, são palavras para descrever algo que não é necessariamente simples o suficiente para uma definição pronta de um ou mais termos. Por exemplo, um homem gay que um dia se apaixona por uma mulher pode se dizer homoflexível, gay birromântico, gay homoflexromântico, bissexual, entre outros termos; mas também pode continuar a se dizer gay com uma exceção.

Depois destes questionamentos, não há muito o que fazer, fora ir em busca de termos, ou só se sentir confortável com seus conhecimentos sobre sua própria atração. Termos juvélicos podem ser úteis para comunicar que certas atrações estão lá ainda que possam não comunicar a totalidade da orientação.

 

Como questionar corporalidade?

Há uma postagem no nosso blog com detalhes sobre isso aqui. Mas, para resumir, aqui estão alguns itens que podem ajudar o questionamento sobre ser intersexo:

  • O corpo teve um desenvolvimento de características sexuais diferentes das esperadas, ainda que ele não possa ser justificado por conta de terapia hormonal (incluindo bloqueadores de hormônios), acidentes ou cirurgias?
  • O corpo passa, passou ou tem motivo para achar que passa/passou por terapia hormonal ou cirurgias relacionadas com características sexuais sem consentimento, e/ou que foram recomendadas com o objetivo de consertar algum problema relacionado com características sexuais?
  • Há ou ouve algum problema ou alguma estranheza cuja justificativa poderia ser níveis de hormônios sexuais serem atípicos naturalmente (incluindo: quantidade/grossura de pelos no corpo, ciclos menstruais irregulares, problemas onde uma consulta médica resultou em medicação que afeta hormônios sexuais)?

Exames podem ser feitos para definir cromossomos ou níveis hormonais para saber se estes estão fora da norma. Porém, fazer tais exames pode não valer a pena apenas para resolver uma dúvida superficial sobre a possibilidade de ser intersexo. Por isso, recomenda-se ir atrás disso somente se houverem outras evidências de intersexualidade.

 

É também importante destacar que não há um caminho certo em relação a rótulos.

Uma pessoa pode se identificar como bi, e depois passar a se identificar como gay, pois percebeu que só estava se identificando como bi pela possibilidade de se sentir atraída por alguém de outro gênero, o que acabou por nunca acontecer.

Uma mulher pode se identificar como lésbica, e depois perceber que só se identificava desta maneira por não sentir atração por homens, quando também não sentia atração por mulheres, passando a se identificar como assexual posteriormente.

Uma pessoa pode se identificar como gay, mas depois descobrir que pessoas com atração que não é exclusiva ao mesmo gênero normalmente se dizem bi, e adotar tal identidade.

Uma pessoa pode se identificar como pansexual, por sentir atração igual em relação a todas as pessoas, depois descobrir que na verdade nunca sentiu atração por nenhum gênero, e se encaixar na comunidade assexual após descobrir sobre esse discernimento.

Uma mulher pode se identificar como grissexual, e depois descobrir que só pensava assim por não aceitar sua atração constante por outras mulheres, mudando sua identidade para lésbica.

Uma pessoa que se identifica como gênero-fluido pode descobrir que na verdade é um homem trans, mas que estava com medo de fazer uma mudança tão drástica em sua identidade.

Uma mulher trans pode descobrir ser librafeminina, após descobrir sobre a existência desta identidade.

 

Também pode existir diferença entre os rótulos usados em círculos diferentes.

Uma pessoa agênero pode se identificar como um homem trans em público, para ser mais aceita.

Uma duramulher trigênero pode se apresentar somente como mulher não-binária, como não-binária, ou até mesmo como mulher, para ser mais aceita.

Uma pessoa ptiloaporagênero pode preferir se apresentar como poligênero em alguns lugares e não-binária em outros, por ter receio de pessoas não entenderem ou aceitarem sua identidade de gênero caso fale em mais detalhes sobre ela.

Uma pessoa abrossexual pode preferir se identificar como bissexual, por ser um termo mais simples e comum.

Um homem torenromântico e assexual com preferência por homens pode se dizer gay, para ser mais aceito em espaços LGBTQIAPN+, e para que mais pessoas levem sua identidade a sério nesses ou em outros espaços.

De qualquer forma, é errado encorajar constantemente pessoas com identidades ditas complexas a “admitir” que podem ser de uma identidade mais simples, assim como é errado dizer que pessoas que usam certos termos mais abrangentes ou comuns não estão detalhando suas identidades o suficiente.